“Proteger. Esse é o significado de paliar, derivado do latim pallium, termo que nomeia o manto que os cavaleiros usavam para se proteger das tempestades pelos caminhos que percorriam. Proteger alguém é uma forma de cuidado, tendo como objetivo amenizar a dor e o sofrimento, sejam eles de origem física, psicológica, social ou espiritual.” A definição é da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Mas você já ouviu falar em cuidados paliativos? Sabe para que servem e quando são indicados?

 

A “Worldwide Hospice Palliative Care Alliance” (WHPCA), organização não-governamental internacional focada no desenvolvimento de cuidados paliativos, estima que ao menos 40 milhões de pessoas precisam deles anualmente, no mundo, incluindo 20 milhões no final da vida. Já a Organização Mundial da Saúde (OMS), sustenta que os cuidados paliativos melhoram a qualidade de vida dos pacientes, seus familiares e até de seus cuidadores frente à uma doença que pode ser fatal.

 

Conforme a OMS, a necessidade global de cuidados paliativos continuará a aumentar como resultado da crescente carga de doenças não transmissíveis e do envelhecimento da população.

 

Assistência personalizada

Segundo o especialista em Clínica Médica do Hospital Moinhos de Vento, Dr. Rodrigo Moura Valle, este estágio, definitivamente, não representa o final da linha. “Ao chegar nesta etapa, não significa que não há mais o que fazer pelo indivíduo. Este conceito ainda é muito presente, porém, totalmente equivocado”, garante. “O paliativismo é uma assistência personalizada, que leva em consideração todas as características únicas da pessoa e de sua patologia, em cada fase do seu processo de adoecimento, e que busca proporcionar qualidade de vida e conforto por meio de um cuidado humanizado”, explica o médico, que também é professor de Pós-Graduação, na Faculdade Moinhos de Vento.

 

Paliativismo: passo a passo

No Hospital Moinhos de Vento, os Cuidados Paliativos iniciaram em outubro de 2018. O grupo presta consultoria e/ou acompanhamento de pacientes, mediante a solicitação do médico assistente, responsável pela internação. Na primeira visita, é feita uma apresentação da área e são coletadas algumas informações importantes para a criação de um Plano (ou Programa) de Cuidado; que vai sendo desenvolvido no decorrer dos dias. 

 

“A biografia do enfermo, a percepção da compreensão dos envolvidos quanto ao diagnóstico e o prognóstico, as necessidades específicas relacionadas a sintomas ou questionamentos, medos, crenças,... Enfim, são levantados vários dados que nos permitem identificar todas as demandas e, assim, recrutar os colaboradores que serão necessários para o atendimento”, revela o Dr. Rodrigo Moura Valle. 

 

Atendimento integral

A equipe multiprofissional é bem diversa: conta com capelão, psicóloga, fisioterapeuta, fonoaudióloga, entre outros. “Dessa forma, cada profissional pode auxiliar de acordo com as suas competências, o que torna o resultado muito mais efetivo”, avalia. “Costumamos enxergar o paciente de uma forma holística (ou abrangente). Isto significa que o indivíduo é visto como um todo: corpo, mente e espírito; considerando, ainda, as suas interações com o mundo que o cerca.”

 

Conforto espiritual

“Quando a pessoa experimenta uma situação de doença grave e incurável, depara-se com a realidade de sua finitude. O que costuma ser impactante”, reflete. “O capelão tem o papel de trazer acolhimento e conforto espiritual, entendendo e respeitando sua crença, e auxiliando na condução e elaboração de todo esse processo, com uma propriedade que outro especialista, dificilmente, conseguiria”, compara.

 

“E quanto antes a pessoa tem acesso a este serviço, mais se beneficia, pois contamos com profissionais que possuem habilidades específicas desenvolvidas para lidar com as inúmeras situações e experiências que este perfil de indivíduos, com doenças graves e progressivas, na maioria das vezes sem possibilidade de cura, costuma vivenciar”, elucida o Dr. Valle, que também atua como consultor em Cuidados Paliativos no Projeto Tele-UTI Pediátrica e Neonatal (que resulta da parceria entre o Moinhos e o PROADI-SUS).

 

Acolhimento para todos

“É importante enfatizar que os Cuidados Paliativos focam na experiência do paciente. Desta forma, buscamos tornar todo o processo de adoecimento menos penoso e sofrido para todos que estão diretamente envolvidos com a situação, incluindo os familiares. Isto passa tanto pela identificação precoce e o controle rigoroso dos inúmeros sintomas, quanto por uma comunicação personalizada, com o objetivo de esclarecer, de forma acolhedora e assertiva, todas as dúvidas que possam surgir.” 

 

“Recordo que, há cerca de 15 anos, questionei uma amiga oncologista sobre a carreira que havia escolhido. Não compreendia como ela poderia trabalhar em um setor no qual as perdas e sofrimentos eram rotina. Hoje, após 6 anos atuando na área de Cuidados Paliativos, entendo que existe vida em cada dia deste processo de adoecimento e que todo esse turbilhão de emoções envolvidas nos permite acessar os indivíduos de uma forma única e verdadeira; desprovidos dos escudos que costumam vestir no cotidiano”, observa. 

 

“Temos a possibilidade de conduzir estas pessoas em momentos intensos, buscando a melhor performance possível para cada fase, com o mínimo de sensações desagradáveis e sofrimento. Sem deixar de vê-las como outro ser humano, que possui uma biografia própria e suas individualidades”, argumenta o especialista.

 

“Como pode-se imaginar, o envolvimento e a vinculação dos profissionais com os pacientes costuma ser muito forte, em virtude da proximidade durante todo este processo e pelo foco na comunicação e escuta ativa na qual são baseados os atendimentos. Tal aproximação traz a necessidade de uma atenção especial para estes colegas, que, frequentemente, precisam lidar com perdas. Sendo assim, o Hospital Moinhos oferece suporte psicológico para seus colaboradores. Além disso, reuniões semanais (chamadas de ‘rounds’) são realizadas para dividirmos com a equipe nossos sentimentos relacionados aos atendimentos”, acrescenta.

 

Apoio mútuo

A especialista em Clínica Médica e Cuidados Paliativos do Hospital, Dra. Mariana Marques, ressalta que estas reuniões fortalecem o grupo, especialmente pelo apoio mútuo. “Além disso, os rounds servem para analisar o melhor tratamento a ser proposto ao paciente, que é acompanhado no Ambulatório, durante as internações e também através de consultorias e encaminhamentos”, detalha.

 

“No Moinhos de Vento, atuamos como uma equipe multidisciplinar, que cuida do indivíduo de maneira física e espiritual. Trabalhar e acompanhar pessoas em Cuidados Paliativos é ter um olhar humanizado sobre um enfermo que possui uma doença crônica, sem possibilidade de cura, com necessidade de controle rigoroso de sintomas, a fim de melhorar sua qualidade de vida e de sua família”, analisa a Dra. Mariana Marques, que também é médica rotineira da Emergência do Hospital.

 

Tratamento humanizado

Este é o mesmo propósito lembrado por outra profissional do grupo. A médica clínica e intensivista, Dra. Paola Morandi, salienta que, dentro do Centro de Terapia Intensiva (CTI) do Hospital, ela e seus colegas se deparam com muitos pacientes em fase final de vida. 

 

“O foco da assistência, geralmente, visa oferecer uma terapia curativa ou modificadora da doença. Mas nesta etapa - em que há a exacerbação dos sintomas - é imprescindível que o médico intensivista reconheça a necessidade de conduzir, com exímia habilidade, um tratamento humanizado, guiado pela biografia do indivíduo e respeitando a sua dignidade”, defende a Dra. Paola, que é especialista em Cuidados Paliativos.

 

Em busca do alívio

Controlar a dor e demais sintomas do paciente também é um dos principais objetivos dos enfermeiros desta área. Isto pode ser percebido em pequenos e significativos detalhes. A opção pela punção por “hipodermóclise” é um exemplo. Trata-se de uma técnica pela via subcutânea para a administração de medicações e fluidos em pessoas com dificuldade de acesso venoso.

 

“O enfermeiro também prevê qualificar a assistência, tendo como ênfase o cuidado integral realizado em conjunto com a equipe multidisciplinar. Aliás, o profissional também é um dos responsáveis pelo treinamento permanente dos colaboradores da instituição sobre o tema, a formação de banco de dados para futuras pesquisas e a participação em reuniões científicas e de discussões de casos clínicos, todas as semanas”, exemplifica Taiana Kessler Gomes Saraiva, coordenadora assistencial do serviço de Oncologia do Hospital.

 

Ela justifica que o enfermeiro tem papel fundamental no Programa de Cuidados Paliativos do Hospital Moinhos de Vento, uma vez que contribui para a avaliação e o acompanhamento dos pacientes. Além disso, planeja e implementa ações que serão desenvolvidas para quem requer deste serviço, visando um suporte humanizado e a promoção de uma melhor qualidade de vida. 

 

Bem-estar 

Qualidade de vida e conforto para o enfermo é o que também buscam os farmacêuticos que atuam neste segmento. “Uma das formas de garantir esse bem-estar é certificando o uso apropriado e seguro dos diversos medicamentos, através da otimização da terapia medicamentosa”, enfatiza a farmacêutica clínica, Luana da Silva Velasco, do Moinhos.

 

“Todo este cuidado é importante para evitar efeitos adversos relacionados à farmacoterapia. Assim, traçamos um plano terapêutico eficaz com o grupo, contribuímos para a instrução da equipe assistencial a respeito do uso de medicamentos em pessoas em Cuidados Paliativos e realizamos o aconselhamento farmacoterapêutico junto a pacientes, cuidadores e familiares, ajudando-os a entender a terapia prescrita, para melhorar a qualidade de vida e garantir a segurança no tratamento.”

 

“Trabalhar com pessoas que vivenciam a finitude (da vida) demanda do profissional de Saúde identificar e lidar com as emoções que emergem em si próprio. O que nos fortalece é a gratidão em poder acolher os que estão em sofrimento, prestando o melhor cuidado, mesmo em uma situação tão difícil”, considera. 

 

Podemos fazer muito pelo nosso paciente

“Isto significa desmistificar a ideia de que não se pode fazer mais nada e, sim, que podemos fazer ainda muito pelo nosso paciente. Assim, quem atua em Cuidados Paliativos convive com dores e tristezas, na sua rotina. Portanto, além de qualificação técnica, é preciso atuar com humanidade; ter empatia e compaixão. E, principalmente, ter preparação psicológica para lidar com este contexto”, pondera.

 

Cuidar de quem cuida

“Os profissionais envolvidos neste trabalho precisam ter seus sentimentos reconhecidos diante da assistência a esses pacientes, de forma que suas fragilidades possam ser acolhidas e tratadas, pois ser cuidado é condição primeira para poder cuidar”, argumenta a psicóloga assistencial do Moinhos, Marceli Cristina Emer.

          

Já o papel do psicólogo em Cuidados Paliativos consiste em promover um espaço de escuta, por meio do qual o indivíduo possa ter seus sentimentos e desejos legitimados, de modo que a sua autonomia seja privilegiada a partir da sustentação de suas vontades e do reconhecimento de seus valores. 

 

“É um processo de acompanhamento no qual a família também precisa ser contemplada para que, além de receber suporte diante do sofrimento trazido pela iminência da perda, possa servir de base ao paciente. Tudo para a preservação da dignidade desta experiência, que toca de maneira profunda a todos os envolvidos. E na qual, como dito no início, os colaboradores do setor também não passam ilesos”, afirma a psicóloga.

 

 Princípios gerais

Vale lembrar que, de acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), os princípios gerais dos Cuidados Paliativos, são:

  • Fornecer alívio para dor e outros sintomas estressantes como astenia (fraqueza), anorexia (perda de apetite), dispneia (falta de ar) e outras emergências oncológicas;
  • Reafirmar vida e a morte como processos naturais;
  • Integrar os aspectos psicológicos, sociais e espirituais ao aspecto clínico de cuidado do paciente;
  • Não apressar ou adiar a morte;
  • Oferecer um sistema de apoio para ajudar a família a lidar com a doença do paciente, em seu próprio ambiente;
  • Oferecer um sistema de suporte para ajudar os pacientes a viverem o mais ativamente possível até sua morte;
  • Usar uma abordagem interdisciplinar para acessar necessidades clínicas e psicossociais dos pacientes e suas famílias, incluindo aconselhamento e suporte ao luto.

 

 

Fontes: Dr. Rodrigo Moura Valle (CRM 30486) é especialista em Clínica Médica do Hospital Moinhos de Vento. A Dra. Mariana Marques (CRM 35651) é especialista em Clínica Médica e Cuidados Paliativos do Hospital. A Dra. Paola Morandi (28193) é médica intensivista do Moinhos. Taiana Kessler Gomes Saraiva é coordenadora assistencial do serviço de Oncologia do Hospital. Luana da Silva Velasco é farmacêutica clínica na instituição. Marceli Cristina Emer é psicóloga assistencial do Moinhos de Vento.

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Prêmios e Certificações

Entrada 1 - Rua Ramiro Barcelos, 910 - Moinhos de Vento, Porto Alegre - RS, 90035-000
Entrada 2 - Rua Tiradentes, 333
Av. João Wallig, 1800 - 3º andar - Shopping Iguatemi Porto Alegre
Avenida Cristóvão Colombo, 545 - Espaço Comercial P5-1