A necessidade de enfrentar a Covid-19 tem gerado um trabalho intenso para todos os profissionais da área da saúde, desde o nível acadêmico, com estudos e análises diárias, até a linha de frente no atendimento aos pacientes infectados. Ao longo dos últimos meses, diversos países adotaram medidas de isolamento social, como restrição da circulação de pessoas em determinados locais, fechamento de comércio e barreiras sanitárias, soluções encontradas para tentar reduzir o avanço da pandemia. A nova doença ainda faz milhares de vítimas fatais diariamente, mas há alguns progressos nos estudos para a aplicação de possíveis vacinas, tratamentos e testes de detecção. Para entender um pouco mais sobre essas possibilidades, conversamos com o Dr. Alexandre Prehn Zavascki, chefe do Serviço de Infectologia do Hospital Moinhos de Vento, para esclarecer as principais dúvidas sobre o assunto.

1.Temos visto diversas notícias sobre pesquisas de vacinas para a Covid-19. Com uma visão sobre o panorama geral, como tu vês tanto os avanços dos estudos quanto a forma como são noticiados?

No momento, há diversas pesquisas com vacinas. As notícias, em geral, têm uma visão mais otimista em relação à realidade. Atualmente, são vacinas na fase 1 ou ou fase 2, que são estudos preliminares. Nenhum desses estudos comprova a eficácia, mas apenas qualificam essas vacinas para, justamente, passarem por uma etapa seguinte, que é a verificação da eficácia em pacientes.

2.Como tu vês as reações da comunidade médica referente às novidades nas pesquisas da vacina?

Na comunidade médica, ainda há um grande desconhecimento na questão de vacinas. Para a maioria dos médicos, as vacinas são todas iguais, acreditando que seguem os mesmos princípios. Mas, na realidade, há muita diferença entre vacinas, entre cada patógeno. Existem patógenos para os quais, simplesmente, não é possível obter uma vacina. Por diversas razões, sejam elas do próprio patógeno ou das pessoas que não conseguem montar uma resposta imunológica aos componentes. Temos muita esperança e, obviamente, vibramos a cada resultado positivo. Mas a comunidade científica e médica, que conhece vacina, olha todos os resultados sempre com muita cautela, sabendo que eles são apenas parte de uma etapa que precisa ser cumprida. Nenhum deles nos indica, de forma segura, que vamos ter uma imunização para o novo coronavírus em um curto período de tempo.

3.De acordo com as notícias, o governo russo deve vacinar sua população ainda este ano. Podes falar um pouco sobre a situação e quais implicações essa ação pode ter?

Sobre a vacina russa é muito complicado falar, porque é uma vacina que não tem os dados publicados. É um princípio da ciência a transparência e a reprodutibilidade, ou seja, é preciso conhecer tudo que foi feito e como foi realizado. Para avaliar, seria necessário ter a capacidade de reproduzir e testar a validade. De qualquer forma, o tempo em que ela foi desenvolvida, já no estudo de fase 3, não é uma vacina que tem a sua eficácia comprovada. O máximo que a gente pode supor, num período desses, seria uma imunização temporária (por poucos meses). Já que não há um acompanhamento a longo prazo de pacientes para saber quanto tempo dura a imunidade gerada pela vacina e se ela realmente gera.

4.Vacinas, geralmente, levam bastante tempo desde o momento em que são descobertas até chegarem à população. Podes falar um pouco sobre sua visão referente aos processos e como essas informações podem chegar ao público geral?

O processo inicia com o uso do patógeno – inteiro de uma forma atenuada ou inativada. Pode ser também por meio de uma tecnologia capaz de pegar uma parte somente desse patógeno, normalmente, uma proteína para qual o organismo reage montando uma defesa e ativando anticorpos. Nem sempre, é possível atenuar a bactéria ou vírus. Em outras situações, a atenuação não consegue formar uma resposta imunológica adequada ou a proteína para o qual o organismo dá uma resposta sofre muitas mutações. Então, são várias dificuldades. Tem que primeiro descobrir o antígeno, fazer estudos em animais, depois realizar os estudos na fase 1 em humanos, que servem para avaliar questões básicas de segurança. Já os estudos de fase 2 avaliam se tem uma resposta imune inicial e também segurança, os de fase 3 avaliam a eficácia e se aprofundam na questão da segurança.Tudo isso demora muitos anos, pois a última fase é testada na vida real e precisa de no mínimo 6 meses a um ano para ver se é eficaz e por quanto tempo protege. É importante para entender com qual frequência a população exposta deve ser imunizada novamente.

5.Sobre tratamento: anteriormente, no blog Saúde e Você, falamos sobre o tratamento para COVID-19 com plasma de pacientes curados. Como essa técnica tem se desenvolvido, temos novidades nos resultados?

A terapia com plasma continua sendo uma das mais promissoras, embora ainda não tenha tido um grande ensaio clínico. Nós tivemos um único ensaio na China, que mostrou um possível benefício no grupo de pacientes graves, mas não críticos. Esse estudo foi interrompido, pois diminuíram os casos de Covid-19 naquele país. Existem milhares de pacientes tratados e, recentemente, foi publicado um estudo em que os autores viram o efeito dose-resposta. Embora não seja confirmatório, é altamente sugestiva a eficácia do uso de plasma de pacientes curados. Ainda é uma terapia experimental, que foi autorizada pelo FDA, mas precisa de mais ensaios clínicos randomizados para maior comprovação.

6.Sabemos que é difícil ter uma previsão de quando a vacina estará disponível para a população, mas, assim que for descoberta, quais seriam os próximos passos (em termos de produção, distribuição e aplicação)?

É muito improvável que a primeira vacina, mesmo que seja eficaz, funcione para 100% das pessoas. Mesmo vacinas consagradas como, por exemplo, a vacina da gripe, tem eficácia de 70 a 80%, dependendo da população. Não é possível esperar que, mesmo que tenhamos uma vacina para coronavírus, ela tenha uma taxa superior à da gripe num primeiro momento, depois poderá ser aprimorada. Outro ponto é a questão de acesso, que será de acordo com os contratos entre fabricantes e governos. Essas negociações definirão a distribuição em condições diferentes em cada local.

7. Como tu vês a percepção da população geral sobre o andamento das pesquisas?

As pessoas são, em geral, bastante otimistas e contam com isso para a retomada da vida normal. Porém, a percepção de pesquisadores e cientistas que compreendem a epidemia e a questão do desenvolvimento de vacinas é de que, mesmo havendo uma vacina no final do ano ou no início do ano que vem, por diversas questões como eficácia incompleta ou a não-vacinação da população ao mesmo tempo, a gente vai ainda conviver com medidas de proteção individual contra essa infecção por algum tempo. Talvez possa ser atenuado, mas não vai eliminar. A vacina não será a solução imediata para tudo.

8.Qual importância das vacinas de modo geral?

Infelizmente, ainda existem movimentos anti-vacinismo. Mas as vacinas são muito importantes e nós contamos com elas para passar por isso, não de forma milagrosa, mas de forma mais rápida. Fiquemos na torcida, mas saibamos ser realistas. Não adianta ter uma expectativa de uma solução mágica, não vamos nos livrar da pandemia, vamos atenuar. E que se façam todas as outras vacinas que já existem para evitar outras doenças.
Fonte: Dr. Alexandre Prehn Zavascki, chefe do Serviço de Infectologia do Hospital Moinhos de Vento.

Agradeçemos pela sua inscrição!

Prêmios e Certificações

Entrada 1 - Rua Ramiro Barcelos, 910 - Moinhos de Vento, Porto Alegre - RS, 90035-000
Entrada 2 - Rua Tiradentes, 333
Av. João Wallig, 1800 - 3º andar - Shopping Iguatemi Porto Alegre
Avenida Cristóvão Colombo, 545 - Espaço Comercial P5-1