Tontura, dor de cabeça, visão turva ou dupla, dificuldade para falar e diminuição da força muscular. Você pode estar tendo um Acidente Vascular Cerebral (AVC) ou ter sido infectado pela bactéria Clostridium botulinum. Recentemente, o assunto ganhou visibilidade internacional quando a Organização Mundial de Saúde (OMS) alertou para um surto de botulismo na cidade de Bordéus, na França.
Turistas infectados
Na ocasião, foram identificados 15 casos suspeitos e uma morte entre consumidores que teriam ingerido sardinha contaminada, feita em conserva artesanal. O produto foi recolhido do mercado para análise e também para evitar novos contágios. Além disso, a OMS ficou atenta para a possibilidade de surgirem novos focos da doença em outros países, uma vez que turistas haviam sido infectados no estabelecimento francês.
De acordo com o Dr. Paulo Ernesto Gewehr Filho, infectologista do Hospital Moinhos de Vento, a doença não é transmitida de pessoa para pessoa, mas é importante redobrar os cuidados com a alimentação ao sair de viagem. “Mesmo estando de férias ou a trabalho, é preciso ficar atento às escolhas de onde vamos fazer as nossas refeições. E observar o cheiro e a aparência do alimento servido, apesar de nem sempre haver alteração no aspecto de produtos contaminados”, ressalta.
Atendimento de urgência
Segundo o médico, felizmente os casos de botulismo em nosso país são muito esporádicos. Entretanto, quando acontecem, necessitam de atendimento médico rápido, pois causam alteração neurológica e paralisia muscular, dificultando a respiração. Em algumas situações, a doença evolui de forma muito acelerada e, se não houver atendimento urgente, pode ocorrer falência respiratória e morte do paciente.
O que é o botulismo?
Conforme a Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde, o botulismo é uma doença rara, grave e de alta letalidade, resultante da ação de uma potente neurotoxina (BoNT) produzida pela bactéria Clostridium botulinum. Para se ter uma ideia, devido à complexidade e a possibilidade de ocorrência de outros casos resultantes da ingestão da mesma fonte de alimentos contaminados, um caso de botulismo já é considerado surto no Brasil e, consequentemente, uma ameaça à saúde pública. Dessa forma, o botulismo exige notificação compulsória imediata aos órgãos de saúde, em até 24 horas.
Números no Brasil
No período de 2006 a 2020, foram registrados 413 casos suspeitos de botulismo, totalizando 399 notificações válidas. Os dados integram o Boletim Epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde.
Sintomas semelhantes ao de um AVC
O Dr. Paulo Ernesto Gewehr Filho, que também é supervisor do Núcleo de Vacinas do Hospital Moinhos, observa que o indivíduo com botulismo pode apresentar sintomas apenas 1 ou 2 semanas depois do contágio, uma vez que a incubação da bactéria pode levar até 10 dias.
Os sinais, relacionados a problemas do Sistema Nervoso Central, podem ser comparados aos de um AVC, como:
- visão turva ou dupla;
- dificuldade para falar ou engolir;
- dor de cabeça;
- tontura;
- vertigem;
- perda da força (pela alteração neurológica);
- paralisia muscular (que afeta também o músculo da respiração, além de braços e pernas).
O paciente também pode apresentar sintomas inespecíficos ou que remetam a simples infecções respiratórias ou bacterianas, como:
- febre;
- cansaço;
- náusea;
- vômito;
- diarreia;
- pálpebras caídas;
- boca seca.
Tipos de botulismo
Atualmente, segundo a Secretaria de Vigilância em Saúde, há três tipos conhecidos de botulismo:
- de origem alimentar é o mais comum e ocorre, como dito anteriormente, devido à ingestão de alimentos contaminados com a toxina pré-formada;
- intestinal, relacionado com a colonização intestinal e produção da toxina “in vivo” em adultos ou crianças muito jovens. Por este motivo, o Dr. Paulo Ernesto Gewehr Filho não recomenda, por exemplo, que menores de 2 anos de idade consumam mel;
- por ferimentos e pela forma iatrogênica (ou por má prática médica), que são causados pela produção “in vivo” da toxina em feridas expostas e por acidentes associados ao uso terapêutico e cosmético da neurotoxina botulínica, respectivamente.
Como tratar uma doença tão grave?
O tratamento baseia-se no diagnóstico clínico rápido, com suporte ventilatório e administração do soro antibotulínico (SAB). Além de contribuir para a implantação imediata de medidas gerais de urgência, é importante a confirmação do botulismo para que os alimentos potencialmente contaminados não fiquem disponíveis ao consumo de outras pessoas.
“Dependendo da gravidade, o paciente pode ficar internado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) por várias semanas necessitando ventilação mecânica e outros cuidados intensivos. Eventualmente, após o tratamento, o indivíduo pode ficar com algumas sequelas como déficit neurológico, fadiga, fraqueza, tontura e dificuldade em respirar com esforço moderado”, esclarece o médico, salientando a necessidade de um atendimento urgente, em caso de sintoma de botulismo.
Em casa, como evitar o contágio com a bactéria do botulismo?
- escolha alimentos com marcas de sua confiança;
- saiba que nem sempre produtos contaminados têm odor ou cor diferentes. Às vezes, a contaminação não é detectável;
- não consuma mantimentos que estejam conservados em latas estufadas, com aspecto ruim ou data de validade vencida;
- faça a higiene do alimento;
- cozinhe os ingredientes por, no mínimo, 15 minutos;
- após o preparo, mantenha a comida refrigerada, abaixo de 15 ºC. Nesta temperatura, mesmo que esteja contaminada, as bactérias que estão nela não conseguirão se multiplicar.
Fonte: O Dr. Paulo Ernesto Gewehr Filho (CRM 29512) é médico infectologista, supervisor do Núcleo de Vacinas do Hospital Moinhos de Vento.